Franz Ferdinand No Campo Pequeno.

Posted by Manuel Cardoso | Posted in , , , , , | Posted on sexta-feira, dezembro 04, 2009



"Campo Pequeno recebeu os toiros do Indie Rock e os aficionados não conseguiram fazer a pega."

"O melhor (...) concerto (...) do ano."

"Um Campo que foi Pequeno para o carisma de Alex Kapranos."

"Um trocadilho jornalístico qualquer a dizer que o concerto foi bom."

"Não fomos ao concerto."

Estas foram algumas das críticas que o concerto de Franz Ferdinand, dia 2, no Campo Pequeno recebeu (agora que me lembro, fui eu que as inventei há bocado, quando finalmente deixei de ouvir o zumbido nos ouvidos provocado pelas colunas e consegui, então, pensar).

Agora só um momento.

Já está. Foi o tempo que precisei para pensar se deveria ou não escrever sobre o espectáculo que a banda escocesa deu em Lisboa, na passada Quarta-feira, ou se não o deveria fazer, tendo em conta a elevada probabilidade de ocorrer, durante o relato do concerto, derrame de lágrimas descontrolado, assim como vociferação das expressões "Quero outra vez!", "Voltem para a semana!" e mesmo "Eu não acredito que estou a chorar que nem um convidado de um programa do Daniel Oliveira!". Há até um estudo, da Universidade de Fernão Ferro - Departamento de Estudos de Depressões Pós-Concerto de Indie Rock / Indie Pop / Indie Electro / Forró, que confirma que há grandes hipóteses de isso acontecer, disponível aqui. Mentira, aqui.

Bom, vamos lá tentar.

Desde o anúncio do concerto de Franz Ferdinand em Paredes de Coura que eu esperava ver esta banda ao vivo. 30 de Julho de 2009, pela noite, Manuel Cardoso não esteve presente no tal espectáculo no Festival Heineken, em Paredes de Coura, pois não teve o aval dos pais para se deslocar até ao Norte do país, isto porque muito poucos amigos dele quiseram / poderiam fazer o mesmo. 31 de Julho de 2009, pela tarde, Manuel Cardoso recebe no seu telemóvel uma mensagem do seu amigo Rodrigo Teixeira que incluia "Franz Ferdinand", "Campo Pequeno", "2 de Dezembro" e um palavrão de euforia. Manuel Cardoso não vociferou tal vocábulo, nem semelhante: a presença dos progenitores na mesma divisão da casa de férias onde todos se encontravam impediu-o de o fazer. Assim, apenas gritou num volume moderado. Ainda assim, estava extremamente feliz.

Dia 9 de Novembro de 2009, Manuel Cardoso, durante um jogo de rugby, organizado na aula de Educação Física, desloca a rótula. Não são para aqui chamadas as dores que sofreu antes de lhe colocarem o joelho no sítio e gesso na perna, e o prurido que sentiu nas semanas seguintes, mas sim a capacidade que teria ou não para saltar, empurrar e gritar as músicas no concerto de Franz Ferdinand, dia 2 de Dezembro. A capacidade, a julgar pelo estado do joelho na véspera do acontecimento, era pouca.

- Mas, ò mãe, eu juro que tenho cuidado.



E assim foi. Ou melhor, e assim fui. Eis-me à porta do Campo Pequeno com um amigo, Guilherme Correia, que não tinha ainda bilhete para entrar no recinto (acabaria por comprar a um indivíduo que disse que comprara na bilheteira, antes de esgotarem, para depois vender mais caro - claramente assaltou três jovens no metro de Telheiras que se preparavam para jantar no Chili's antes de se deslocarem até ao Campo Pequeno). No conjunto de pessoas que se aglomeravam junto à entrada do espaço, eu não me encontrava antecedido por muitas pessoas na fila e, lá dentro, consegui lugar junto às grades (não no centro, um pouco mais para o lado do baixista [ah é verdade, o leitor não foi, não faz a mínima ideia onde estava o baixista. Pronto, um pouco para a direita, de quem olha para o palco, não de quem está no palco].

Quando entrei para a plateia, eram umas oito da noite e ainda tive de esperar uma boa hora pela banda que abriria para banda de abertura, que, sendo uma banda de abertura, abriria, mais tarde, para a banda principal que, nessa altura (depois da banda que tinha aberto para a banda que abriria a banda pelo concerto da qual paguei realmente para ver e a banda que, após isso, tinha aberto para a banda pelo concerto da qual eu paguei realmente tocarem, para além de uns posteriores largos minutos de espera a ouvir música [leia-se ouvir música executada a partir de um dispositivo electrónico, não música ao vivo] um tanto inapropriada) tocaria. Bom, respectivamente, falo de The Doups, The Phenomenal Handclap Band e, mas quem é que foi o boi ignorante que perguntou?, Franz Ferdinand.

Os The Doups, uma banda portuguesa muito jovem, apresentaram músicas aparentemente bem construídas, ainda que acompanhadas por umas letras que a originalidade não agraciou, pelo menos por agora. Energia não lhes faltava, pois não. Parece até que não levaram o que os artistas que antecedem "os artistas da noite" (ainda para mais, sendo esta banda os artistas que antecederam os artistas que antecederam "os artistas da noite") temem levar: com as costas das pessoas, que vão enrolando calmamente os seus narcóticos, enquanto ouvem dizer "esta é a segunda música do nosso EP, chama-se «Segunda Música do Nosso EP», já tem passado nalgumas rádios, se souberem a letra cantem, se não souberem enrolem-me um parpalho enquanto tocamos". As bandas de abertura dizem sempre piadas, para ver se nós, rindo (acordando, assim, o sistema urinário), nos lembramos de ir à casa-de-banho a tempo, antes do "main act".

Quem abriu realmente para Franz Ferdinand foram os americanos The Phenomenal Handclap Band. Trata-se de uma numerosa banda funk, com elementos à volta dos quais foi montado um dispositivo que faz com que acreditem ter nascido nos anos trinta/quarenta, vivendo agora nos anos sessenta - isto a acreditar pela indumentária de alguns. Estilo muito interessante, vozes femininas sensuais, teclados desconcertantes.

Se quisesse entrar no campo do humor negro, perguntar-me-ia se o fim da banda Franz Ferdinand suplantaria, no que concerne a danos, a morte de Franz Ferdinand, arquiduque da Áustria-Hungria, em Junho de 1914, assassinado pelo extremista sérvio Gavrilo Princip, acontecimento que desencadeou a Primeira Guerra Mundial. Mas, como decente adolescente que sou, não o faço.

Estava a ver que não vinham para o palco. Mentira, eu sabia que vinham, mas a minha rótula em recuperação não me ouve e já estava a reclamar devido ao muito tempo em pé.



Alex Kapranos, Nick McCarty, Paul Thompson e Robert Hardy pisam o palco. Gritaria, claro. Segundo os últimos alinhamentos, "Bite Hard", do último álbum, "Tonight: Franz Ferdinand", seria a primeira faixa a ser tocada. Não. "No You Girls" é a escolhida e bem que os pais das adolescentes disseram às suas filhas, "Não, vocês raparigas não devem saltar nos concertos. Isto porquê? Porque acabam por roçar nos rapazes, que acabam por gostar.", mas elas a isso fizeram orelhas moucas (era necessário, para poupar o sistema auditivo para o concerto) e saltaram.

A seguir, a genial "The Dark Of The Matinée" e, mais uma vez, pensaram os progenitores, "São onze da noite e ainda agora começou o concerto. A partir de agora, só vai a concertos às quatro da tarde.".

Bom, chega de relacionar os títulos das músicas com desabafos de familiares. Não tem interesse, já que passando por uma excelente versão de "Can't Stop Feeling", a mais passada recentemente nas nossas rádios; a clássica "Do You Want To"; a agradável surpresa (não era esperada no alinhamento) "Twilight Omens" e a humoristicamente romântica "Tell Her Tonight", eu é que me ia passando.

"Take Me Out". Nem no almoço no Hospital Miguel Bombarda se terá alguma vez verificado tamanha loucura, com direito até a pirotecnia (uma tocha no meio do público). Claro que, utilizando esse objecto, esse rapaz (eu vi num vídeo que foi um rapaz) como que disse "Take Me Out" para os seguranças, que lhe fizeram a vontade ("Take Me Out" não no sentido que é à expressão atribuído na música "Mata-me!", mas noutro sentido que lhe é concedido na língua inglesa, "Tira-me daqui").

Ulysses foi o senhor - digo, a faixa - que se seguiu e, como uma das mais populares do novo álbum, prolongou a euforia de "Take Me Out". Esperava há muito tempo por poder ver Ulysses ao vivo: há uns meses aderi ao vício desta música, durante bastante tempo. A calma "40'" e a irónica "What She Came For" trilhavam o caminho triunfal para o final do concerto. "Outsiders", que não se inclui no grupo dos trabalhos de Franz Ferdinand da minha predilecção, seria, aparentemente, a última (para alguns, claro que eu tinha a certeza que existiria encore ), pois foi seguida de um épico momento de percussão a quatro que parecia ditar um apoteótico final.

Mas houve, realmente, um regresso. Consistiu num emotivo "Walk Away", num enérgico "Michael", num estranho "All My Friends", dos LCD Soundsystem e, finalmente, num dançável "Lucid Dreams" (o que não significa "dançado": o longo segmento de electrónica desta música quebrou um pouco o êxtase do público do Campo Pequeno).

Consegui, depois do concerto, autógrafos da banda e não só estive ao pé de Alex Kapranos, como balbuciei qualquer coisa ao lado do indivíduo que não queriam deixar entrar em Lisboa, na alfândega, por carregar consigo doses ilegais de carisma.

A minha rótula (como já referi, em recuperação) poderia não ter perdoado tamanha traição. Mas perdoou e portou-se lindamente: foram quase zero as vezes que me puxou pela t-shirt, berrando, "Vamos embora!"; "Quando é que isto acaba?" ou "Porque é que tens as calças no fundo do cu? Daqui a bocado estás a mostrar a joelheira que me protege e eu não quero que as pessoas me vejam nesta figura."

Comments (1)

Adorei a review, especialmente esta frase "indivíduo que não queriam deixar entrar em Lisboa, na alfândega, por carregar consigo doses ilegais de carisma", tive de a pôr no meu Twitter de tão fantástica que é xD

Realmente foi um concerto excelente (o que é pouco para descrever o quão fantástico foi) :D

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